domingo, 16 de março de 2014

Planeta das Beldades


Imaginem a cena: mulher linda atravessando a rua, vestida com uma roupa impecável, cabelos bem cuidados, pele bonita, maquiagem perfeita. Ela faz  menção de atravessar a rua, olha para o sinal, desiste e perde-se no próprio olhar. Antes de eu passar com meu carro, verifico a dissonância daquele olhar e concluo a meu modo:
“Mulher bonita não combina com um olhar triste”.
Ok! Me dê alguns minutos para que eu me explique.
Imagine um planeta cheio de beldades se sentindo feias. Magras se sentindo gordas, jovens se sentindo velhas, espertas se sentindo tolas.  Enfim, todas se sentindo insatisfeitas consigo. Comecei a acreditar que vivo nesse planeta, o qual, segundo alguns homens de outros planetas, as beldades brotam da terra!Dizem que há mais mulheres  do que  homens, mas já me disseram que o problema é que eles morrem em massa entre 18 a 25 anos.  O resultado dessa desigualdade, é que lá na frente teremos 10, 15 ou até mais mulheres para cada homem. Eu particularmente não acredito nesse  “termômetro da noite” ,  pois é inegável que as mulheres são mais sociáveis, gostam de se reunir, portanto, vão se encontrar inevitavelmente aos bandos na noite.
Enquanto isso, e em menor número, os homens saem menos, são mais tímidos. Além disso, contam com o consolador “PFC”,  Playstation, Futebol e Churrasco.
Mas e as beldades? Creio que vivem  num contexto de tragédias confluentes: lindas subnutridas de espelhos quebrados X bonitinhos supernutridos de espelhos distorcidos.
O planeta das beldades vive repleto de insatisfações balizadas por modelos tão conservadores que, na menor das desilusões, lá está um corpo feminino jogado na primeira lixeira da esquina.
Mulher bonita  nesse planeta, em geral, tem uma péssima autoestima!
Enquanto isso os machos no planeta das beldades elevam seu passe de todas as formas. O   gordo, o velho, o tolo, todos pegam! E se pegam, para que esforço? Oferta grande, preços baixos, consumidores empapuçados! Apesar do mercado aquecido, ainda topamos com alguns caprichos, como a importação do recato.
Em resumo, não basta ser bela, é bom ser quase uma virgem.  Ah, não estão acreditando? Um dia escutei de um rapaz de 30 anos o seguinte: aqui (na capital das Beldades) as mulheres não valem nada! No interior, elas são mais recatadas...
Quanta bobagem!
O panorama é o seguinte, algumas exigem muito, outros exigem mais do que realmente podem bancar, e outras não exigem nada! Aquelas que não exigem, inflacionam  o mercado e impõem um jogo que ainda não tem uma regra clara.
Mas e os impactos desse contexto? Alguns efeitos dessa dissonância são visíveis, homens pouco vaidosos e mulheres biônicas gastando os tubos no salão de beleza. Algumas desesperadas;  outros confusos e inseguros. Uns tontos, se perdendo de tanta oferta, mal degustando, mal conhecendo e prontos para o descarte. Elas distorcem, se humilham, se vingam,  se desvalorizam e, com o tempo, vão entristecendo o olhar.
No planeta das beldades, a disputa acaba com as amizades entre as mulheres e, sobretudo, acaba com o amor próprio.
O problema é que muitas beldades desesperadas se lixam para a ética! Passam por cima das amigas e não vêem diferença entre homens solteiros e casados.
Pobre de algumas beldades, agonizando nesse planeta desigual!
O espelho da beldade mostra tudo, mas não convence. A cada lugar uma beldade mais linda, mais perfeita.
E como explicar que a mais linda de todas as beldades se sinta sozinha? Tadinha, esmola, quando é demais, o santo desconfia, e o pior, o santo não  banca.
Viver no planeta das beldades sendo mediana arrumadinha é como ser a mulher invisível daquele filme brasileiro, com a vantagem de que o protagonista nem precisaria se esforçar muito para imaginar. Aliás, se ele se esforçasse um pouquinho, certamente teria que fugir para debaixo da cama, pois não daria conta da multidão de mulheres invisíveis...
Ah! Boa pergunta! Será que eles estariam dando conta dessa multidão?


2 comentários:

  1. Cláudia
    Ao ler teu intrincado e profundo texto, em especial quando escreves que: “Mulher bonita não combina com um olhar triste”, fiquei imaginando o que teria te levado a tal conclusão. Lembrei-me do filósofo Wittgenstein afirmando que as coisas não possuem sentido se não estiverem relacionadas, unidas. Em sua obra – Tractatus – diz: “Assim como não podemos de modo algum pensar em objetos espaciais fora do espaço, em objetos temporais fora do tempo, também não podemos pensar em nenhum objeto fora da possibilidade de sua ligação com outros”. Como se percebe nesse aforismo, Wittgenstein aduz que o significado de uma coisa está ligado diretamente à existência dela junto a outras coisas, pois somente assim essa coisa aparecerá e poderá ser pensada. Continuando a leitura, confesso que fiquei surpreendido com a série de motivos que embasaram tua afirmativa. Nunca imaginei que existisse tanta insatisfação, por parte dessas lindas mulheres, nem tampouco que as mesmas sofressem de péssima autoestima. Você afirma que “o espelho da beldade mostra tudo, mas não convence”. No livro "A teoria do romance" o autor húngaro György Lukács tenta descobrir por que a humanidade tem necessidade espiritual de um espelho (um espelho à sua medida, personalizado) acaba vinculando o espelho ao romance. Já Narciso abeirou-se de um regato de águas límpidas e quando, exausto, se debruçou sobre ele para mitigar a sua sede, enamorou-se de sua própria imagem aí refletida. Tentou enlaçar o que via, mas rapidamente se apercebeu que era ele próprio e assim ficou horas e horas a fio olhando as águas. Será que as beldades acabam sozinhas por conta do narcisismo? Olha! Eu ainda prefiro as “arrumadinhas invisíveis” me permitindo a seguinte ressalva: fique invisível para os outros e bem, mas muito bem, visível para mim.

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    1. Mais que bacana estas citações e tuas reflexões! Como contribuem e me fazem pensar contigo... sim , tens razão Narciso nos espreita, tuas palavras sempre muito oportunas! Obrigada amigo!
      Ps: sempre visível! :)

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