Peter Van Pels e Anne Frank |
Será que um dia esqueceremos o verdadeiro encontro?
Hoje eu realmente me preocupo muito com este assunto. Mas admito
que na minha adolescência, esta era a menor das minhas preocupações...
Aos 13 anos, eu teria o meu primeiro encontro com um livro, “O
Diário de Anne Frank”. Anne tinha 13 anos quando começou a escrever seu diário,
infelizmente numa condição inóspita de confinamento na Segunda Guerra Mundial. Passados
mais de quarenta anos, quem diria que eu e Anne nos tornaríamos cúmplices do mesmo amor? Enquanto ela descrevia sobre o seu amor por Peter, eu me apaixonaria por aquele
menino do livro que surpreendentemente eu encontraria nos corredores da minha escola
nos anos 80!
Não foi difícil reconhecê-lo, mesmo porque Anne o havia
descrito minuciosamente para mim: "Ele tinha cabelos escuros, olhos
castanhos lindos, bochechas rosadas e um nariz encantadoramente pontiagudo”.
E lá estava Peter ao alcance dos meus olhos e do meu
coração. Peter nunca soube da minha existência, até
porque não era necessário, ele já existia para mim, mas no fundo sempre foi de
Anne...
David Vetter |
Muitos meses se passaram entre
olhares jamais correspondidos.
Sem que eu soubesse, naquele mesmo ano de 1983, os pais de David Vetter,
lutavam para manter o filho vivo. Após 12 anos confinado em uma bolha de
plástico, que o mantinha livre de contaminações, os médicos vislumbraram uma alternativa
de cura para sua doença. David nasceu com
uma deficiência imunológica rara. Em 1984, fez um transplante de medula dentro da
bolha, mas devido a complicações em seu pós- operatório, foi retirado da
bolha e acabou morrendo.
Infelizmente, a vida não imitou a arte.
Quando David tinha 4 anos, sua história já era conhecida e inspirou um filme marcante nos anos 70, “O menino da bolha de plástico”. Apesar de uma
história tocante e triste, o menino Tod, interpretado pelo estreante, John Travolta, consegue sobreviver na bolha até a adolescência
e apaixona-se pela sua vizinha, razão pela qual deseja viver em sociedade.
Assistindo a uma reportagem do ano de 1976, sobre o caso de
David, um médico responsável pelo caso, chamou a bolha de plástico de David de “ilha da
vida”.
Ilha da vida? Segurei a expressão e não consegui largá-la.
Conforme relatos daquela época, na verdade o menino temia sair da bolha
e morrer e, na puberdade já começava a apresentar um
comportamento de revolta pela sua condição.
Se pensarmos, Anne Frank também viveu confinada numa espécie de bolha quase que inevitável. Ambos estiveram confinados em bolhas de proteção contra a morte, mas que na realidade os impediram de viver.
Não tenho dúvidas de que meu amor platônico serviu de ensaio para
os amores reais.
Mas e o nosso adolescente “new platonista” da era virtual, teria a mesma sorte de encontrar seu amor virtual nos corredores da escola?
O que dizer do adulto em tempos de múltipla escolha?
Teria coragem de romper a bolha que lhe garante plena autonomia?
E aqueles que se mantêm unidos, coabitando em suas bolhas high tech, estariam livres das “contaminações” do cotidiano?
Mas e o nosso adolescente “new platonista” da era virtual, teria a mesma sorte de encontrar seu amor virtual nos corredores da escola?
O que dizer do adulto em tempos de múltipla escolha?
Teria coragem de romper a bolha que lhe garante plena autonomia?
E aqueles que se mantêm unidos, coabitando em suas bolhas high tech, estariam livres das “contaminações” do cotidiano?
É inquestionável que as bolhas de Anne e David os mantiveram vivos, mas
essas supostas proteções estão longe de
serem chamadas de “Ilhas da Vida”.
Infelizmente, as bolhas não os preparam para a vida, apenas adiaram seus finais.
A morte para Anne, Peter e David ocorreu fora da bolha, mas isso não é regra.
Infelizmente, as bolhas não os preparam para a vida, apenas adiaram seus finais.
A morte para Anne, Peter e David ocorreu fora da bolha, mas isso não é regra.
Hoje o que me impressiona são as bolhas autofágicas que se
encerram em caracteres digitados e imagens alteradas. Será que um dia
esqueceremos o toque da pele? Como lembrar algo nunca vivido?
O virtual nunca substituirá o toque, o calor do rubor e o frio na barriga que invade pela lembrança do amor presenciado.
O virtual nunca substituirá o toque, o calor do rubor e o frio na barriga que invade pela lembrança do amor presenciado.
Exaurida de tantas bolhas de plástico, preferi me lembrar
das bolhas de sabão! Que bom poder recordá-las! Bolhas feitas de fluidos. Bolhas
de ar, leveza e colorido. Bolhas que se elevam! Bolhas fugazes que brilham e explodem no tempo e no ar. Bolhas que se multiplicam! Bolhas que
surgem de um sopro de vida. Bolhas que nascem do sopro no ar!