quarta-feira, 4 de janeiro de 2017

ESPERANÇA

Cláudia Coelho
(Porto Alegre, Dez, 2016)

Após cinco anos de atividades voluntárias, junto a ex-apenados do sistema penitenciário de Porto Alegre. Fui questionada diversas vezes, por colegas de trabalho, se eu não deveria trabalhar no sistema prisional fechado.
Minha resposta sempre foi a mesma, “ prefiro trabalhar com a ESPERANÇA”.
Quando me dizem que as pessoas morrem tortas e nascem tortas, refuto veemente ao considerar que todas aquelas, mesmo que tortas, e que procuram ajuda psicológica, estão imbuídas de um sentimento: ESPERANÇA.
Sérgio Cortella, em uma de suas brilhantes palestras, considera que precisamos ter a ESPERANÇA do verbo “esperançar”, e não do verbo “esperar”. Segundo o filósofo, esperançar é buscar, é não desistir!
Zigmunt Bauman, sendo considerado um pensador pessimista,  nos ensina com a dor. O sociólogo nos convida a olhar o mundo com lentes tão fortes, que a nossa fé pode até vacilar.  Porém, uma visão mais atenta, demonstra que ele tem alguma ESPERANÇA na humanidade, quando afirma que todos os ajustes são cíclicos, inevitáveis e temporários.
Mesmo que afirmemos, em tom de brincadeira, que a ignorância às vezes é uma bênção, a felicidade advinda deste estado de alienação amaldiçoa uma sociedade que se furta do exercício da cidadania, sem compreender os danos ao coletivo e às futuras gerações.
O conhecimento e o desenvolvimento da espiritualidade são fundamentais.  No meu caso,  no Raja Yoga  aprendi que o verdadeiro poder é o do conhecimento. Não o poder da dominação, mas o poder que nos conduz à sabedoria. Esta que nos faz mergulhar em atitudes mais sensatas e pacíficas. E, dessa forma, vamos reunindo forças para “respirar o mundo” com ESPERANÇA.
Respirar com calma  e “inspirar o outro” através de ações propositivas,  ou seja, dar o exemplo. Içami Tiba afirmava que nunca a palavra valeu tão pouco em comparação com o exemplo que devemos dar ao outro.
Inspirar as pessoas é, de fato, uma das maneiras mais mágicas de se viver. Sobretudo, porque nos exige heroísmo. Porque não é fácil contrariar a balança de todos os males que nos assolam. A balança quer pender para desesperança...  Nessas horas, me inspiro no fotógrafo e ativista, Sebastião Salgado, que, no final de 1990, após fotografar o genocídio em Ruanda,  sentiu que o seu corpo adoecia. Naquela época, decidiu retornar à fazenda onde viveu na infância e a encontrou devastada. Diante daquela situação, ele e a esposa resolveram replantar a floresta. A exemplo do que realizou na mata, entre 2004 e 2012 ele cruzou o mundo fazendo registros com foco na natureza intocada pelo homem, imagens de ESPERANÇA.
Diante do bombardeio de imagens de desesperança e desinformações, onde a lente que me mostra o mundo nem sempre me inspira e gera o conhecimento,quem hoje estaria mais alienado?
Aquele que só enxerga a desesperança no mundo ou aquele que acredita na ESPERANÇA?

#logicasinvertidas

E assim nasceu o Projeto Ladrilhar


“Se essa rua fosse minha, eu mandava ladrilhar...”
Foi com essa música na cabeça, que eu acordei numa manhã de outono. 
Imediatamente vi uma imagem, era a escadaria da minha rua toda bela e colorida de cima a baixo. 
Abandonada há mais de 50 anos
Há menos de um mês eu havia recebido uma doação de azulejos e pastilhas, e a minha intenção era dar continuidade nas atividades de mosaico em minha casa recentemente revitalizada :). Mas o volume de materiais, e mesmo o fato de ter recebido em doação, induziam-me a pensar que eu deveria destinar aquilo para algo público, mas não sabia muito bem onde, e de que maneira...
A música da infância continuava me martelando enquanto eu tomava café. A imagem daquelas lindas e vivas cores me instigava, me lembrei da Selaron do Rio de Janeiro. 
Resolvi então acolher aqueles sinais...
Coloquei um tênis, peguei uma trena, um bloco de anotações e, resolvi re-conhecer o local, que há um ano teria sido alvo de descontentamento dos moradores da minha região.
Revitalizada obra finalizada em Nov 2016
Ocorre que, a escadaria abandonada há mais de 50 anos, é local de passagem de moradores, alunos de escolas da região e pasmem, também por motociclistas que a usavam-na como pista. Mas também abrigava usuários de drogas e criminosos ocasionais. O motivo era que a conexão com um beco facilitava a fuga e até mesmo furtos de carros em nossa rua.
Enfim, há um ano todos nós desejávamos mesmo era acabar com o beco, com a escadaria, com a insegurança... 
Obviamente que não poderíamos resolver aquele problema daquela forma... a escadaria não tinha nada com aquilo... 
A escadaria era uma conquista...apesar da degradação.
Ao subir a escadaria naquela manhã, era como se eu reencontrasse a minha infância. Me deu dó da pobre malfadada escadaria, a qual imputavámos uma série de responsabilidades. Subi seus degraus corróidos pelo tempo e fui percebendo o desafio de recuperá-la...mas também vi seu potencial frente áquela comunidade.
Apesar da ação do tempo, o local é surpreendentemente verdejante e o canto dos pássaros são a trilha sonora de quem ali passa. O limo parecendo um veludo entre os vãos e lindas heras em suas laterais mostravam que apesar de tudo a natureza não esquecera aquela escadaria. Resolvi então contar cada lance de escadas, ao mesmo tempo que retomava a minha relação de afeto e memórias com aquele espaço. Confesso que o primeiro e maior lance de escadas desafiou meu equilíbrio, pois cada degrau simplesmente não comportar o meu pé de 36, obrigando-me subir de lado. Senti que não seria tão fácil uma empreitada ali, pois teríamos que fazer muitos e muitos reparos. Chegando ao primeiro patamar, olhei a vista de lá de cima e me espantei com a visão do morro em frente, ainda preservado, para nossa sorte. 
Obra completa 88 degraus em mosaico
Segui minhas anotações e percebi que uma água escorria pela lateral da escada, então percebi que um senhor alto de cabelos brancos lavava os degraus de cima. Logo imaginei que aquele senhor que tão cedo zelava pela escadaria, poderia ser um futuro simpatizante. Quando finalmente cheguei ao topo, o tal senhor me perguntou o que eu fazia ali. Me apresentei dizendo que era uma moradora com algumas intenções e que tinha um projeto de revitalizar aquele espaço já que eu era mosaicista, meio maluca rsrs, etc etc. Mal sabia ele, que na verdade o Projeto nascia em cada degrau que eu ia subindo. Quando terminei de mencionar minhas intenções, ele me olhou com um ar intrigado, e disse: - Você não vai acreditar... Esta manhã eu estava vendo um programa de TV sobre ações sociais, e comentei com a minha esposa: “meu sonho era ver um dia esta escadaria toda LADRILHADA... 
A música...o sonho...as cores...a palavra conectada.
E assim nasceu o Projeto Ladrilhar...
Assista à matéria veiculada em 22/12/2016 pela TV Record:


Manual do Pobre Machista




Amedeo Modigliani
Cláudia Coelho 
(Porto Alegre,Dez 2016)

Ser for jovem e feia, tudo bem.
Ser for jovem e gorduchinha, tudo bem.
Ser for jovem e burra, tudo bem.
Ser for jovem cheia de celulite, tudo bem.
Se for jovem e pobre, tudo bem.





Mas se for velha...
(no Brasil a partir 40 anos você  é velha)
Não adianta ser bonita, magra, inteligente, sem celulite e rica. Você é  velha!

Se ele for velho, tudo bem.
Se ele for gordo, tudo bem.
Se ele for burro, tudo bem.
Até se ele for pobre, tudo bem.
Mas se ele for jovem...
Não faz  a menor diferença!

Se for o velho casado com a "velha".
Ele será  descontente porque ainda sonha com a jovem, magra e sorridente.
Pois não há praga maior que uma velha gorda que não  lhe mostra os dentes.

Mas se o homem for abençoado e bem casado com a tal moça do seu sonho adolescente?
Ele poderá  pensar... Porque não  ter mais uma jovem, se  há tantas carentes?

Por fim, se ele não tiver nem a jovem, e nem a carente... muito menos a pobre velha que um dia lhe fez contente?
Então ele abrirá  mão  de todas as tolas exigências de perfeição.
Restará ao pobre velho, solitário e impotente um último desejo:
Que ela seja jovem, mesmo que indiferente!