Início da
noite de segunda, último grupo de avaliação para obtenção de CNH. Eu organizava
alguns papéis para a última testagem, todos na sala cansados assim como
eu.
Olhei para o
grupo e fui contando um, dois, três... ops, um sorriso?
Seis pessoas e
um sorriso! Mas o que um sorriso fazia ali, naquela hora?
Aproximei-me
daquele homem de aproximadamente 35 anos de idade, e percebi que, além do
surpreendente sorriso, ele apresentava uma deformidade congênita nas mãos.
Questionei-o
sobre suas possíveis limitações diante dos desafios que eu iria impor-lhe. Ele
respondeu-me dizendo “não, que não haveria qualquer problema em realizar os
testes”.
Decidi então
preencher a entrevista para ele, afinal eu queria poupar-lhe o esforço das
mãos.
Terminamos os
testes, e ele continuava com os olhos vibrantes, sorriso pleno e inundando-me
de uma felicidade sobrenatural.
Apesar do meu
cansaço físico, a minha mente insistia em querer pesquisar aquele ser que
desafiava o adiantado da hora e as nossas limitações físicas.
Comecei a
entrevista. Por favor, me diga qual a sua principal característica? E ele
respondeu, “ser feliz ”. A resposta me arrebatou! O sorriso dele mais parecia
um rolo de tinta tingindo a sala e a mim. Diante daquela afirmação, suspirei e
lhe devolvi um sorriso de admiração.
Naquele
instante, morri de vontade de ligar para alguns pessimistas de plantão e outros
tantos chorões de barriga cheia!
Inadvertidamente,
eu queria mostrar-lhes um ser humano, como se fosse um animal em extinção!
Meu sorriso
ainda admirava aquele ser que, para o meu deleite, justificou a sua
resposta,“Como eu não poderia ser feliz? Apesar das minhas dificuldades, fiz
uma faculdade, passei em um concurso, sou professor de matemática e minhas
últimas cirurgias nas mãos foram um sucesso! E agora estou aqui, fazendo minha
carteira de habilitação.”.
Qualquer
pessoa otimista diria que o professor de matemática soube fazer a melhor conta
da sua vida. Até porque todo otimista sabe fazer a conta justa de suas
vitórias!
Nesse mês
viajei para Colômbia, e uma das primeiras surpresas foi encontrar no hall de
entrada do hotel, em Bogotá, um imenso e deslumbrante arranjo de flores. Ao ver
aquela imagem estupenda no tamanho e nas cores, me aproximei do arranjo. Olhei
para os lados para que ninguém percebesse e toquei nas flores desconfiando que
pudessem ser artificiais. Surpresa! Eram flores naturais!
Em Cartagena
conhecemos Pablo. Ele nasceu em Medellín. Em Medellín? Sim! Disse ele, “e sabem
que lá nós temos uma tradição?”.Eu e meus amigos só poderíamos dizer
que conhecíamos uma tradição, a do “Cartel de Medellín”.Pablo
sorriu, balançando a cabeça, sabendo da fama da cidade. Ele então, pegou o seu
celular e se empenhou em nos mostrar as imagens da tradicional festa da cidade
e a sua versão colorida da cidade de Medellín.
Medellín é
conhecida como a “Cidade da eterna primavera”. Em agosto, a cidade é inundada
de arranjos de flores, sendo que o evento mais representativo da Feira é, sem
dúvida alguma, o Desfile dos Silleteros, onde camponeses percorrem grandes
distâncias carregando lindos e pesados arranjos em suas costas.
Pablo nos
mostrou uma Medellín linda e festiva. Mas nem por isso deixou de referir
algo, que nem recordo agora sobre a tão afamada rede de traficantes de drogas.
Ele também poderia ter falado um pouco mais da vida difícil que leva, dos
desafios na vida pessoal e do trabalho que desenvolve em regiões de extrema
pobreza.
No entanto,
Pablo preferiu nos mostrar o seu sorriso. Assim como o professor de matemática,
parece que ele resolveu fazer a conta de suas vitórias!
O arranjo de
flores naturais no hall do hotel, em Bogotá, parece ser a metáfora perfeita
para descrever uma parte de nós diante de uma felicidade que parece
sobrenatural. Essa parte, hesita e desconfia. Escolhe o que vê,
e inevitavelmente enxerga o lado artificial das coisas.
Não é de se
admirar que alguns prefiram não se aproximar...
Pablo e o
professor de matemática parecem ter optado pelo toque e, ao tocarem, se
preencheram de cores.
Sorte daquele
não que se assusta com as cores, como toque e o sobrenatural!
A palavra felicidade, em grego “eudaimonia” é composta do prefixo “eu”, que significa “bom”, e de “daimon”, “demônio”, que, para os gregos trata-se de uma espécie de semideus ou gênio, que acompanha os seres humanos. Portanto ser feliz, para os gregos, era dispor de um “bom demônio”, o que estava relacionado com a sorte de cada um. Quem, por ventura, tivesse um “mau demônio” era fatalmente infeliz. Na Ética a Nicômaco, Aristóteles aponta: “Por isso chamamos de absoluto e incondicional aquilo que é sempre desejável em si mesmo e nunca no interesse de outra coisa. Ora, parece que a felicidade, acima de qualquer outra coisa, é considerada como esse sumo bem. Ela é buscada sempre por si mesma e nunca no interesse de outra coisa; enquanto a honra, o prazer, a razão, e todas as demais virtudes, ainda que as escolhamos por si mesmas (visto que as escolheríamos mesmo que nada delas resultasse), fazemos isso no interesse da felicidade, pensando que por meio dela seremos felizes. Mas a felicidade ninguém a escolhe tendo em vista alguma outra virtude, nem de uma forma geral, qualquer coisa além dela própria”. Ser feliz não é para qualquer um. Parece que a felicidade está cada vez menos presente no cotidiano do ser humano moderno. Parabéns Cláudia. Você foi muito feliz em tratar do ser feliz, de flores e sorrisos. Viva a felicidade.
ResponderExcluirLinda crônica, Cláudia! Está te superando na percepção dos detalhes que nos fazem humanos e melhores!
ResponderExcluirCoisa boa!
Querida amiga!
ResponderExcluirAprendi na minha vida que não devemos passar o tempo todo reclamando. Aprendi que devemos viver como se fosse o último dia da nossas vidas e que no dia seguinte renasceremos para conquistar novos obstáculos. Nunca se esqueça "A persistência é algo digno daqueles que não desistem dos seus sonhos".
Att.: Professor de matemática
Querida amiga!
ResponderExcluirAprendi na minha vida que não devemos passar o tempo todo reclamando. Aprendi que devemos viver como se fosse o último dia da nossas vidas e que no dia seguinte renasceremos para conquistar novos obstáculos. Nunca se esqueça "A persistência é algo digno daqueles que não desistem dos seus sonhos".
Att.: Professor de matemática